E.T. Bilu, Drogas e o Panculturalismo

Daniel de Lucca
4 min readSep 17, 2018

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[Repórter]: Qual a sua mensagem pra Terra?

[E.T. Bilu]: Apenas que… busquem conhecimento!

Kant? Descartes? Platão? Quem são esses perto do nosso ETzinho lusófono BILU? Claramente vindo de um planeta distante - onde a paz universal reina e e a tecnologia é apenas uma ponte para a fraternidade dos corpos energéticos — , Biluzão mandou o papo: BUSQUEM CONHECIMENTO.

Falar de temas “polêmicos” é aquela coisa: existe muita desinformação, medo, abusos e até tristezas. Há também de se considerar que nossa sociedade é plural e que existem diversas narrativas — algumas antagônicas entre si — sendo contadas a partir de um mesmo fato. Por isso, para facilitar a comunicação e evitar confusões, é necessário sempre definir o objeto que estamos falando. Então, vamos lá: o que é Droga, afinal?

Segundo o Livro “Drugs and Drug Policy”, da Editora Oxford, “Droga é uma substância química que age em algum processo biológico que não seja se hidratar ou se nutrir” e ainda “Algumas drogas vêm de plantas, outras de laboratórios. […] O efeito de uma droga pode ser bom ou ruim, ou os dois, dependendo da dose”.

Esse texto, entretanto, não tem como objetivo revelar as discussões e disputas cientificas sobre tipos de drogas (psicoativas, psicoativas abusivas…) e suas consequências no funcionamento do corpo humano. A questão essencial aqui, na verdade, é a seguinte: por que o uso de drogas é um problema? E então, para tentar uma resposta, caímos na palavra que compõe o titulo: PANCULTURALISMO.

PANCULTURAL: COMUM OU RELEVANTE PARA TODAS AS CULTURAS HUMANAS.

Fui criado por pais que, assim como o ET Bilu, buscavam conhecimento. Mais ainda: faziam questão que eu e meu irmão o obtivéssemos. Ainda lembro do dia em que meu pai, voltando do trabalho, deu de presente um Globo Terrestre pra mim e para o meu irmão. Nossa diversão era fechar os olhos, rodar o globo e pará-lo com o dedo indicador — sempre caindo em lugares novos e curiosos.

Agora imaginem a seguinte situação: o ET Bilu trouxe do planeta XPTO-500 uma tecnologia capaz de nos teletransportar para as sociedades que apontávamos no mapa. Onde quer que fossemos - desde os Nuer na África, passando pelos Inuits na Groenlândia, até a capital do Império Mongol — o uso de drogas recreativas estaria presente. Assim como o aborto, o uso de drogas é Pancultural. O que mudaria, na realidade, é a maneira como dada sociedade se relaciona com a droga.

Membros masculinos Nuer junto com o Antropólogo Evans-Pritchard. Os Nuer faziam um fermentado alcoólico a partir de ingredientes encontrados nas regiões pantanosas do norte da África.
Baco: deus romano do Vinho, aculturado do deus grego Dionísio — Caravaggio (1597).
Inca manuseando folhas de coca, na Bolívia. A planta pode ser usada a) De maneira tradicional (feita há pelo menos 3000 anos) para mascar, auxiliando a vida em altas altitudes. Ou b) como base para a produção da cocaína, ilegal e majoritariamente exportadas para os países centrais do capitalismo.

É provado e sabido que onde há humanos há consumo de drogas. A questão, na nossa sociedade, é como vamos lidar com elas. Iremos criminalizar - fortalecendo milicias, corrupção e clandestinidade - ou legalizar - de modo a proteger, ressignificar (construir um novo sentido), informar e minimizar o poder das drogas?

A criminalização e a guerra contra as drogas é relativamente recente. Seu principal encabeçador, os Estados Unidos da América, começou por volta de 1940. Entretanto, alguns estados da União já caminharam para a legalização, por exemplo, do uso recreativo da Maconha. A Califórnia pretende arrecadar pelo menos $7 bilhões de dólares em impostos neste ano. Isso tudo pode ser convertido em dinheiro para educação, turismo, saúde e outras obras públicas; além de criar empregos no campo e na cidade.

No Brasil, temos o curioso caso do presidente Jânio Quadros (1960) que aprovou somente dois projetos de lei durante sua passagem no cargo mais alto do executivo tupiniquim: 1) regulamentação do tamanho do maiô feminino nas praias e 2) proibição do “loló” (lança-perfume). O ideal, na realidade, seria a aprovação de leis e a criação de políticas públicas que garantissem a qualidade da droga que se consome (assim baixando gastos com saúde) e que garantissem amplo atendimento à pessoas dispostas a tratar seus vícios e reduzir danos (como é feito em alguns países nórdicos). Seria interessante, também, avaliar a permissão de propagandas que fazem apologias — dando preferência e maior alcance àquelas que alertem sobre os perigos do uso excessivo, por exemplo, do álcool.

Também não podemos deixar de lutar por uma legalização que beneficie aqueles e aquelas que mais sofrem com a criminalização: populações periféricas, pobres e de maioria negra. Segundo dados disponibilizados pelos governos estaduais, 1 em cada 3 presos no país responde por tráfico de drogas: isso é muita gente sendo encaminhada pra uma instituição ainda mais falida, com grandes chances de praticarem delitos mais graves.

“Você sabe o que é frustração? Máquina de fazer vilão” — Racionais MC´s

“Eu tô aqui com uma nove na mão;
Cercado de droga e muita disposição,ladrão;
Fui rotulado pela sociedade;
Um passo a mais pra ficar na criminalidade;”

Dicas de leitura:

  • Os Nuer — Evans-Pritchard
  • Relativizando — Roberto Damatta
  • Legalizar as Drogas para melhor previnir os abusos — Line Beauschese

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Daniel de Lucca
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Written by Daniel de Lucca

Estudante de Ciências Sociais e Direito. Gosto de árvores, política, literatura e poesia. Cuido de plantas e de abelhinhas. Conexão SP — RJ.

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